Aproximamo-nos da meia-noite. Mais alguns minutos, estaremos vivendo o dia 19 de novembro de 2019. Menos de um mês desde que iniciei a leitura agora concluída. Refiro-me ao romance O mundo se despedaça. Escreveu-o CHINUA ACHEBE. Editou-o a Companhia das Letras para o selo TAG, uma das mais promissoras e vitoriosas iniciativas culturais da indústria gráfica. Não mais – nem menos que um clube de livros. Diferente, porém.
Se, como escreve Alberto da Costa e Silva, a obra é símbolo do romance nigeriano contemporâneo, pode-se nele encontrar a amostra do que ocorre em tantas outras regiões do mundo.
ACHEBE narra a história do enfrentamento, por clãs do sudeste da Nigéria, do processo de desintegração cultural, resultante do contato com “o homem branco”. Nada que seja ignorado por habitantes de outras regiões do Globo, particularmente nas nações mais pobres. Onde quer que sejam postos os olhos (às vezes homens fardados e armados, também) dos invasores, registram-se fenômenos e processos semelhantes.
Em Amuófia, uma dentre nove aldeias nativas de seu país, o autor pinça muitas das manifestações comuns ocorridas em outras nações. Dentre elas (as manifestações, não as nações), a imposição de valores estranhos à sociedade nativa, a repressão à resistência dos naturais do lugar, o abandono de práticas ancestrais, o controle político autoritário, a violência daí decorrente, nem sempre ostensiva.
Destacam-se, nessa verdadeira peça literária de caráter genialmente alegórico, o uso da religião como instrumento de persuasão e conversão, tomada esta no sentido político também; o exílio dos dissidentes, favorecido por estruturas judiciárias votadas à discriminação mais que à Justiça; o estímulo à acomodação, preventiva em relação ao ainda não ostensivo movimento de rejeição ao invasor. Em meio a esse caldo de cultura encontram-se condutas ilustrativas de preconceitos existentes em nações de quase todos os continentes. É o caso, por exemplo, do sentimento alimentado pelo herói, Okonkwo, em relação ao seu filho Nwoye, um jovem homossexual.
Os costumes (o casamento, o velório etc.), a economia (o inhame e o óleo de palma), os rituais, a guerra, a educação entre os ibos (o clã de que Okonkwo é líder) – tudo isso mostra ao leitor a importância de reconhecer o outro e admitir sabedoria na conduta compreensiva e fraterna diante dele.
É ao mesmo tempo, um grito de alerta. Aos que entendem a mensagem de ACHEBE não passará em branco sua preocupação com o genocídio a que estão sujeitos os povos dos países mais pobres. Despedaça-se o mundo, porque seus muitos pedaços despertam cobiça nos poderosos e passam a eles pertencer, ainda que sob formas dotadas de perversa sutileza.
Um grande e oportuno livro!
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