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Foto do escritorProfessor Seráfico

Iniciação e exercício

Faz hoje exatamente 70 anos, desde que antecipei aprendizado enriquecido ao longo de toda minha vida. Passadas mais de oito décadas, relembro até o dia em que o conceito de Aristóteles (o homem é um animal essencialmente político) me atraiu e ainda hoje me desafia. Já contei algumas vezes quando tive a atenção voltada para os fatos políticos, então um adolescente que cursava a 2ª série ginasial, no Colégio Estadual Paes de Carvalho-CEPC, na cidade onde nasci. Era quente aquela manhã, como quase todas na cidade de Belém do Pará, nesta fase do ano. Essa manifestação da natureza não nos surpreendeu, a mim e aos colegas que pretendiam entrar pela porta principal do velho e respeitado colégio público do Pará, inaugurado em 1841. Surpreendeu-nos, isto sim, a razão de sermos impedidos de cumprir as obrigações ginasianas: fora decretado feriado nacional, diante do suicídio de Getúlio Vargas. O Presidente da República matara-se com um tiro no coração. Naquele exato momento, iniciava-se dentro de mim, coração e cérebro, o processo que me faz atento ao mundo que me cerca e àquele ao qual só eventualmente tenho acesso. Seja pela literatura, seja pelo convívio social, seja pela interlocução com pessoas sem discriminação de qualquer natureza, seja ainda por eventuais e agradáveis viagens a outras plagas, despertava em mim, no 25 de agosto de 1954, o gosto pelas coisas da Política. Como se à morte do Presidente correspondesse o nascimento de um interesse que, descubro depois, deveria seduzir e entreter todo aquele que se pensa humano. O tiro que feriu o coração de Getúlio foi o mesmo que, disparado pelo ex-membro da Juventude Comunista Carlos Frederico Werneck de Lacerda, saiu-lhe pela culatra. Daí o adiamento para dez anos depois, do golpe de estado que se vinha tramando contra o líder da Revolução de Trinta. O mesmo que, reivindicado nas ruas ainda hoje, deixou sequelas nem sempre fáceis de remover, a despeito do quão desejável tal remoção, pelo menos para grande parte da população honesta e democrática. Naquele mesmo ano, pude experimentar mais que a repercussão da morte de um político que saía da vida para entrar na História (ele mesmo o disse, em sua carta-testamento). Uma espécie de aulas práticas do fazer político me pôs em contato com a realidade - da minha cidade, sua periferia e as gente sofrida que a habita. Candidato a vereador em Belém, meu pai me levava às visitas, reuniões e outros eventos políticos, próprios das campanhas eleitorais. Para um garoto de 12 anos, mais que motivo de encantamento. Como se estivesse saindo de outra caverna, uma vez que a primeira havia sido abandonada quando ainda tinha somente 5 anos de idade. Fiz-me alfabetizado, nesse então. Fiz-me em processo de politização naquele ano, decorridos cinco desde que abandonara a primeira caverna. Durante o exercício do mandato do meu pai, de curta duração (um ano apenas, eis que João Baptista Seraphico de Assis Carvalho foi nomeado Superintendente de Navegação dos Serviços de Navegação da Amazônia e do Porto do Pará- SNAPP, órgão do então Ministério da Viação e Obras Públicas-MVOP), frequentei as sessões da Câmara Municipal de Belém. Vice-líder da bancada do Partido Social Democrático-PSD, lá também meu pai me ensinou além do que se pode esperar da paternidade séria, honesta, justa e enriquecedora. Organizador de sindicatos e associações de trabalhadores na capital paraense, dele terei recebido as diretrizes que me esforço por seguir, até que feneçam minhas últimas forças. As dele se esgotaram em 12 de fevereiro de 2000. As minhas, enquanto forem mantidas, não o apagarão de minha memória, nem cessará meu interesse pelo que considero a mais excelsa maneira de mostrar-se humano - a participação política, porque nela se encontra o espaço mais legítimo para o exercício do traço fundamental que faz diferente o animal que se diz superior, a vontade.

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