Ingenuidade e malícia

Há quem acredite nos números, como se eles fossem a tradução exata de qualquer realidade. Os mesmos que têm fé religiosa inabalável nos milagres produzidos pelo mercado. Capitalistas por opção religiosa, recitam com insistência o mantra do empreendedorismo, essa panacéia provedora da saúde da sociedade humana e da felicidade e prosperidade de cada indivíduo. Gastam seu escasso vocabulário na reiteração de uma verdade que a realidade teima em rejeitar: seja patrão de você mesmo. A senha, percebam, gera o ataque permanente e cada dia mais rigoroso e perverso contra o Estado. Segundo esses apóstolos dedicados ao mal, inspirados pelos deuses da prosperidade ilusória, os negócios privados - e só eles - asseguram a felicidade dos seres humanos. Esse discurso malicioso tem levado pobres desempregados à tentativa de aplicar eventuais ganhos resultantes da dispensa do emprego em operações cujo produto, com frequência, é o agravamento de sua pobreza. Isso é o que registram números recentemente divulgados, ao tratar do fracasso em que incorre parcela expressiva dos MEIs - Micro Empresários Individuais. Faz tempo, órgãos oficiais, mesmo aqueles sob o controle dos generosos empresários brasileiros, informaram que dois anos de atividades são quantos bastam para chegar ao fechamento de grande parte das pequenas e micro-empresas. Persuadida pelos apóstolos dessa religião maldita, multidão de pobres coloca seus parcos recursos em verdadeiras aventuras, como se tem sabido. As informações mais recentes dizem disso melhor que diria o mais acerbo crítico do mercado.