Do outro lado da
linha
vejo o brilho do sol
nem tão perto que ofusque
nem desmaiado
que impeça o cálculo
preparo-me como todos
para pôr os pés
mais adiante
Sigo sem medo
na cabeça velhos
sempre lembrados
sonhos
o sangue fluindo
em borbotões dentro de
mim...
Sonhos sangue
e aquela vontade
de mudar o mundo
sem dar muita importância
ao tempo
inimigo que é tolice
supor vencer
esse gigante invencível
indiferente
presunçoso
a zombar de todos e
de cada um
cada qual com o
seu - que não é dele
tempo
Quando chegamos
ele já estava em
toda parte
como à espera
do visitante incômodo
que iria ocupar
a infinitude de que dispunha
sem dela jamais abrir
mão
Aquele inimigo
a quem não interessa
o sim
tanto quanto não o
comove o mais desesperado
não
De soslaio ele nos
aprecia
seja largo o caminho
demasiado estreita seja
a via
por cima dos ombros
nos contempla
arrogante entediado
por saber-nos passageiros
em território de que
se sabe dono
por período só por ele
conhecido
nunca revelado
Cuidamos todos de não
perturbar a permanência
sem a vergonha
antecipada
por derrota líquida
ou não
não obstante certa
Tratamos de evitar
o aborto do que recheia
nossa bagagem
ora pesada como se cruz
um dia fora
ora tão leve
que nos põe entre
mil asas
Depois de atravessada
e deixada para trás
a linha permanece
raramente se desfaz
cada passo à frente
às vezes nos torna
diferentes
outras vezes
fica mais tenaz
Conosco segue em
calendário
o que muitos constroem
e chamam Vida
à diferença dos que
desanimados e em desespero
preferem chamar calvário
Incapaz de ganhar
ao menos uma batalha
dessa guerra de desenlace
conhecido
o ludibrio impossível
tem um sucedâneo
chame-se calendário
relógio ou ampulheta
até o dia em que
arquivo sem uso
o passeio chega ao fim
no fundo úmido
da mais vil gaveta.
Manaus, 31.12.2021
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